Estudos de Tráfego: uma peça essencial para o planeamento urbano e o licenciamento responsável

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Luís Caetano

Os Estudos de Tráfego são hoje uma ferramenta indispensável no processo de licenciamento de operações urbanísticas em Portugal. Mais do que uma exigência técnica, representam um instrumento de gestão territorial e de planeamento sustentável, permitindo antecipar os impactos que novos empreendimentos — sejam habitacionais, comerciais, industriais ou de serviços — terão sobre as redes viárias e de transporte existentes. A sua correta elaboração e análise garantem que as decisões urbanísticas sejam tomadas de forma informada, equilibrando o desenvolvimento urbano com a capacidade de suporte da infraestrutura.

Um Estudo de Tráfego bem conduzido não se limita a quantificar volumes de veículos. Ele analisa padrões de mobilidade, modos de transporte, horários de pico, interações com transportes públicos e condições de segurança rodoviária. Permite simular cenários com e sem o novo empreendimento, identificando eventuais constrangimentos, a necessidade de novas infraestruturas ou de medidas de mitigação — como ajustamentos semafóricos, reconfiguração de acessos, criação de percursos pedonais ou melhoria da oferta de transporte coletivo. Assim, contribui diretamente para a eficiência do sistema de mobilidade e para a qualidade de vida urbana.

Em Portugal, diversos municípios têm vindo a reforçar a exigência e a qualidade técnica dos Estudos de Tráfego no âmbito dos processos de licenciamento. Câmaras como Lisboa, Cascais, Oeiras, Porto ou Braga dispõem de regulamentos próprios e de guias técnicos que definem metodologias, escalas de análise e critérios de aceitação dos estudos apresentados pelos promotores. Estas boas práticas municipais promovem transparência, coerência e previsibilidade no processo de avaliação, evitando abordagens casuísticas e garantindo que os impactos sobre o sistema viário são devidamente compensados ou mitigados.

Outro aspeto relevante é a articulação entre os Estudos de Tráfego e o planeamento urbano de médio e longo prazo. Um empreendimento isolado pode parecer inócuo, mas o somatório de várias intervenções num mesmo eixo viário pode gerar congestionamento, degradação ambiental e perda de qualidade urbana. Por isso, a análise deve ser integrada, considerando o enquadramento territorial, a hierarquia da rede viária e as políticas municipais de mobilidade. Municípios que cruzam os resultados destes estudos com os seus Planos de Mobilidade Urbana Sustentável (PMUS) ou com modelos de tráfego municipais conseguem antever impactos cumulativos e definir medidas preventivas mais eficazes.

As melhores práticas também passam por promover a digitalização e a transparência dos processos. A disponibilização de bases de dados partilhadas, a utilização de plataformas GIS e a normalização dos formatos de entrega dos estudos tornam o processo mais eficiente e reduzem a duplicação de trabalho entre técnicos municipais e projetistas. Além disso, a adoção de metodologias compatíveis com ferramentas de simulação reconhecidas — como PTV Visum, Aimsun ou Vissim — assegura uma avaliação mais rigorosa e comparável entre projetos.

Em síntese, os Estudos de Tráfego não devem ser vistos apenas como um requisito burocrático, mas como um investimento na qualidade do território. A sua boa prática permite compatibilizar crescimento urbano com mobilidade sustentável, reduzir conflitos de tráfego, aumentar a segurança e proteger o interesse público. Cabe aos municípios continuar a evoluir na definição de normas claras e critérios técnicos robustos, e às equipas de planeamento e engenharia assegurar estudos baseados em dados sólidos e metodologias atualizadas — só assim o desenvolvimento urbano poderá ser verdadeiramente sustentável, equilibrado e orientado para as pessoas.